quarta-feira, 16 de novembro de 2005

"Nova evangelização: confissão de uma perplexidade"

Respigo de um texto do jurista e deputado do PSD Paulo C. Rangel um texto vindo a lume no Público de hoje, que começa por considerar
"Um dos grandes acontecimentos culturais dos últimos anos foi, sem dúvida, o Congresso Internacional para a Nova Evangelização, que a Igreja de Lis­boa acaba de acolher e organizar. Trata-se de um marco na nova atitude cul­­tural e pastoral da Igreja Católica portuguesa, só possível devido ao carisma de D. José Policarpo (...)".
E apresenta um dos seus motivos de perplexidade:
"A procissão - nomeadamente pela sua inumerável adesão - constitui uma afirmação inquestionável de presença da Igreja na cidade. Presença im­pres­sio­nan­te, devendo suscitar, como pacificamente parece ter suscitado, o res­­peito geral pela fé e pela cren­ça de cada um e pelo direito a manifestá-la no es­­paço público. Pre­sença que, sem considerandos de oportunidade pastoral e ambiente teológico, se­guramente se mostra útil. Útil, numa sociedade como a por­tu­guesa, onde uma larga maio­ria de cató­licos é relegada para um oprimente silenciamento mediático. Útil tam­­­­bém, por­que frequentes vezes se esquece e se esconde o respeito e a to­le­rân­­cia com que essa larga maio­ria assiste, quoti­dia­namente, à publicitação maciça de concepções e opiniões alternativas ou até contrárias às suas. Um sinal paradoxal, todavia. Paradoxal, porque a linguagem e a ordem sim­­­­bólica daquela manifestação religiosa - por mais ternura e afeição que pos­sa congraçar ­- parece aquém do ambiente e da oportunidade da "nova e­van­­ge­li­za­ção". Parece, aliás equivocamente, fazer convergir a dinâmica e o apelo mís­­­­tico de Fá­tima com uma conjuntura de crise e de incerteza generalizada. Pa­radoxal, porque a procissão evoca uma tradição mais rural do que urbana, releva mais duma pas­toral do passado do que do futuro e convoca mais uma "confirmação da fé" (ainda que uma fé plural e diferenciada) do que uma "reevangelização". Paradoxal, por­que a lin­gua­gem usada foi estritamente tradi­cio­nalista, pouco apta a despertar os ci­dadãos hoje dispersos, podendo ter tingido a visibilidade e a intencionalidade cardial do congresso. E de pouco valerá um paralelo, que já vi esboçado, com as experiências multitudinárias pro­ta­­go­­ni­za­das por João Paulo II. Estas, mesmo quando fiéis de­positárias de uma conservação da tradição - e é um assumido sobrevivente do chamado catolicismo "pro­gres­sista" que o escreve -, relevavam de uma in­ter­pelante linguagem de pro­xi­midade, de uma simbologia inovadora, de um gesto humanamente cativante. Também aqui o testemunho pode valer mais do que a doutrina.".

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