segunda-feira, 18 de abril de 2005

Uma Igreja para os nossos filhos
Teresa Martinho Toldy, Teóloga, Professora na Universidade Fernando Pessoa (Porto)
In Público, 18.4.2005

Mais importante do que saber quem será o próximo Papa, é saber o que será a Igreja no futuro. Que Igreja para os nossos filhos? E, em função dela, que Papa para os próximos tempos?

Começa agora o Conclave para a eleição do novo Papa. As atenções de uma parte do mundo estão concentradas em Roma. Os católicos aguardam, muitos, com expectativa, outros, com preocupação. As especulações são muitas. Os "papáveis", ao que parece, também... Tem sido frequente, ao longo da história da Igreja Católica, a eleição de um candidato considerado "improvável" ou nem sequer mencionado. Foi, aliás, o que aconteceu na eleição do Papa João Paulo II.
Partilho esta expectativa, bem como a preocupação. Estou, contudo, convicta de que a Igreja constitui uma realidade e uma experiência que não se esgota na escolha de um Papa para a orientar. É convicção da Igreja que é o Espírito Santo que a conduz. E esta convicção fundamenta um adágio antigo segundo o qual a Igreja é sempre reformável, está em constante processo de evolução, numa tentativa permanente de se aproximar mais da vontade de Jesus Cristo e da experiência fundacional do grupo de discípulos e de discípulas que ele reuniu à sua volta.
Como tal, e, apesar de saber que corro o risco de ser "politicamente incorrecta", diria que, mais importante do que saber quem será o próximo Papa, é saber o que será a Igreja no futuro. Que Igreja para os nossos filhos? E, em função dela, que Papa para os próximos tempos?
Uma Igreja mais humana a Igreja para as futuras gerações deveria ser uma Igreja cuja opção radical pelos mais pobres fosse inquestionável e óbvia, antes de mais, para os próprios excluídos, mas também para os poderosos deste mundo. Esta humanidade da Igreja deveria ser acompanhada de uma atitude de escuta do mundo. Não ficaria mal à Igreja não se colocar tanto na posição de mestra, como na atitude de companheira de caminho de um mundo cuja história continua em aberto. Uma Igreja mais humana implicaria, então, da parte da sua hierarquia e do Papa, a perda do medo de enfrentar e de fazer experiência da existência quotidiana de todos os homens e mulheres deste mundo: o amor, a sexualidade, a paternidade e a maternidade, o trabalho, a intervenção sócio-política, mas também as perplexidades, as angústias, as incertezas, que fazem do ser humano aquilo que o define como simultaneamente próximo de Deus e frágil como o barro. Enquanto a orientação pastoral da Igreja estiver entregue exclusiva ou preponderantemente a pessoas que não fazem esta experiência comum a todos os seres mortais, a Igreja corre o risco de se tornar irrelevante, porque completamente alheia à realidade humana.
A Igreja das discípulas e dos discípulos de Jesus a Igreja para as futuras gerações deveria ser uma Igreja menos centrada em Roma, que abandonasse decididamente uma concepção piramidal - com o Papa no vértice, seguido pelos bispos, estes, pelos padres, e, por sua vez, estes últimos, pelos diáconos - para se converter à concepção de Igreja presente no Concílio Vaticano II - uma Igreja cujos membros são todos discípulos de Jesus, com funções diversas, mas com igual dignidade e possibilidade de intervenção. Seria necessário prosseguir corajosamente esta linha de pensamento, em particular, reconhecendo a todas as mulheres e a todos os homens cristãos um papel activo na determinação das linhas de intervenção sócio-pastoral da Igreja, portanto, o direito a participar nas decisões tomadas no interior da comunidade, o que deveria levar à valorização e revitalização das estruturas de participação já existentes, bem como à possibilidade de criação de novas estruturas, se necessário. A participação de todos nas decisões que têm implicações para todos deveria dar lugar a uma reflexão sobre a possibilidade de equacionar determinados cargos e funções de uma forma não vitalícia, mais ágil, mais colegial, mais democrática.
Nota final continuo a alimentar o sonho de que os nossos filhos vejam uma Igreja na qual o ministério ordenado, em todos seus graus, seja partilhado igualmente por homens e mulheres.

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